sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

POEMA DO PALADINO CANSADO






Meu coração é bandeira branca hasteada
a tremular em forte vento,
presa a mastro que olha pro mar:
amplidão das esperas.

Não tenho símbolos
ou conto histórias,
sinais de riquezas
ou marcas de glória,

apenas um coração que espera,
invisível,
tentado a brutalizar-se,
a tornar-se ordinário,
insensível,
vagabundo...

Já fui águia branca
de vôo silente,
de olhos precisos
e coração independente...

Ave impiedosa,
racional,
inatingível,
sem sentimentos,
sem emoções....

Hoje sou um coração que suplica,
branca bandeira que treme e tremula
ao mar que murmura,
levando e trazendo
lembranças doridas:
PAZ, PAZ, PAZ.....

quarta-feira, 2 de maio de 2012

UM SONHO FEBRIL

Febre. Febre - da - tristeza. Convulsões frenéticas. Ânsias e suspiros. Vapores sobem ao ar infesto formando arabescos, docéis e platibandas, nichos e fachadas, portas e varandas. Arde. Arde até desfalecer. Falece. Falece até se esvair. Se esvai. Esvai até o precipício. De lá contempla os horizontes de um outro infinito. Um infinito interior. Interior infinito, de interno teor, teor insondável. Mar retirado, além - mar do além - mar ainda não cartografado, de línguas jamais ouvidas, porque puras e santas. Lá nesta terra foi deixado um coração de olhos nublados, que ainda espera na beira da praia o regresso da nau partida. Rosa selvagem. Filha sem mácula. Eva saudosa. Pássaro triste. Por entre as névoas sombra bisonha, qual a de um ébrio, toma contornos de vivo humano. E os olhos nublados raiam o dia, o dia esperado, ao verem nas formas do náufrago bêbado o amor esperado...

domingo, 22 de abril de 2012

UMA PRECE À NOITE
Como é belo o silêncio da noite! Bendita criação, bendita treva precursora daquilo que espera o coração. Vem, oh dama, recolher-me em teus braços de abrigo, no teu leito balouçante, que balança à tua brisa! Canta as tuas cantigas na lascívia de tua voz ou na candura com que cantam as mães quando somos criancinhas. Aquieta a minha mente, traz sossego ao coração, consola com teus perfumes minha cansada razão. Deita aqui do meu lado, guarda -me em ti bem apertado até sermos um só E quando chegar o dia, a tua revelação, também vou transfigurar-me junto com a criação.

quinta-feira, 19 de abril de 2012

VERSOS DE UMA SAUDADE!

Transborda de mim a saudade,
em versos efusivos,
de espaço que transborda do espaço
aumentando as distâncias.

Quero o bem que eu tinha,
não aquele que eu queria ter,
o bem idealizado
que se desvaneceu
com o Sol da verdade.

A luz deste Sol não traz certezas.
Traz a dúvida.
Traz alertas.
O que é certo?
O que é verdadeiro?

Reclama - me o Sol o meu olhar!
Nunca mais fitei meus olhos na beleza que não passa!
Nunca mais deixei que me enlevase,
que saciasse a minha alma!

Por isso vivo a morrer de sede,
cambaleando, ando a morrer de fome,
e delirando, busco vis ilusões,
que não preenchem esta metade.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

SUSPIROS DE UM PEREGRINO

Ando enfastiado deste alimento.
O Maná sacia o ventre,
mas não mata
a fome do coração.

Ando cansado
desta velha rotina,
de saciar estas feras
e arder com o sol.

Caminho atrasado,
sem ser pra ninguém
senão este óbvio
sinal do que devo.

Dormir
já não descansa meus olhos,
nem alivia minha mente,
tampouco o corpo pesado
que minhas pernas carregam.

Quero sair de mim,
ver novos horizontes
e encontrar ermida
onde possa hibernar!

Quero deixar na terra
esta figura velha;
o novo que é vindo
reclama que acabe
esta alongada espera!

QUISERA!

Quisera beijar-te até morrer,
em um êxtase branco,
numa sinestesia
que não se entende:
se vive.

Quisera sorver teu sabor devagarinho,
como quem sorve mel de bom néctar,
como quem toma bom vinho,
sem pressa de vida,
temores ou culpa.

Vivo a sofer de sede,
cambaleando de fome,
palpitando de saudades,
sentindo o frio daqueles
que já não têm abrigo.

Caminho por estrada
que não parece ter fim,
sem consolo, sem alento,
teimando na fé,
cultivando esperanças,
sonhando com o éden perdido.

Caminho como o peregrino do deserto,
em busca de um oásis,
delirando de saudades
no calor da solidão.

As vezes peço a Orfeu:
que me deixe nos sonhos,
que me prenda nos campos;
nos verdes campos
em que vivo contigo.

Quisera ficar para sempre
nos Campos Elísios
a sorver teu sabor devagarinho
como quem sorve mel de bom néctar,
como quem toma bom vinho,
sem pressa de vida,
temores ou culpa.

sexta-feira, 13 de abril de 2012

POEMA CRÔNICO III - O CONTEMPLADOR DE TEMPESTADES

Sou o contemplador de tempestades,
tenho sempre os olhos cheios de encanto,
vejo beleza onde ninguém a enxerga,
tenho meu prazer em entender o "caos"!

Nem toda ordem é entendida por todos.
Nem todo mundo é entendido pela ordem.
Nem todo entendimento é alcançado
pela ordem de todos.

Eu vi a beleza daquela que passou,
senti a desordem que sua beleza me causou,
nasceu em mim o desejo de apreender
o mero reflexo que consegui captar.

Oh rica tempestade! Oh rico turbilhão!
O contemplador é feliz
porque nela encontra mil mundos,
mil ângulos, o todo,
as partes, os perfumes,
os sabores, os humores,as canções,
o ódio, os amores e as ilusões:
névoas, sombras, delírios, moções!

Na tempestade há mil portas
para quem sabe enxergar!
Triste é o míope que não quer,
o ceticista convencido
e os acometidos de normose.

Fiz amizade com o caos,
o traí e transformei-o em ordem.
Fiz amizade com a ordem
e ela me traiu me devolvendo o caos.

Na tempestade há mil vozes que conversam,
redes inúmeras que se conectam
buscando consenso,
acertando nexos,
possibilidades
novas e inéditas.

Falam mil línguas em completa harmonia,
mil idiomas, mil fonemas, mil gramáticas,
mil expressões que o ser do humus só percebe
porque lhe afagam com carinho os ouvidos.

Como é bom na tempestade ser pequenino.
Não é vergonhoso, na mão de Deus, ser um menino.
Como é bom subir, degrau por degrau,
colhendo as lições que nunca se acabam.