terça-feira, 27 de março de 2012

PROPOSTA

Deixa eu viajar sobre teu corpo
como a chuva que viaja pelo céu.
Deixa que eu te beije como a água
que refresca e que sacia a escasssez.

Sou água que também tem sede.
Sede de chover fininho,
com carinho,afagando, derramando,
adentrando, penetrando, conhecendo,
envolvendo, misturando, fecundando....

Vamos evolar nossos vapores,
às nuvens, enviar nossos humores.
Subamos, eu em ti e tu em mim:
como um só incenso de amor.

Até que nosso clímax se expresse,
em raios, ventanias e trovões;
vibrando a natureza em convulsões
de escada para a doce plenitude.

Nesta hora tudo fará silêncio.
Neste instante tudo repousará esquecido:
do existir, do porvir, do passado, do aqui,
do agora, do poder, do viver, do morrer...

Naquele instante tudo será uma imensa alegria:
que não se entende,
que só se vive
em uma gota
de eternidade
que se deseja
que nunca acabe.

domingo, 25 de março de 2012

SOBRE AS FLORES ALTERADAS

Procurei entre as flores o perfume de sempre.
Mas as flores não me deram o perfume de outrora.
As flores foram alteradas,
foram adulteradas,
não tinham mais pétalas
eram flores geladas.

Procurei nos sorrisos a verdade inocente,
os sonhos risonhos,os sonhos de sempre.
Mas as flores me deram um sorriso disfarçado,
sorriso de lobo
buscando a presa.

Elevei os meus olhos buscando a beleza,
dos campos pintados de cores floridas.
Mas vi flores tingidas, opacas,
tão jovens e tão velhas!
Curtidas!

Percebi que o mundo tornou- se estéril.
A beleza profusa de outrora se esgota.
E os homens padecem de sede e de fome
em imenso delírio de grande fartura.

Quem roubou a beleza das rosas?
Quem levou o calor da ternura?
Quem roubou -lhes a fé no amor
e o tempero da doce candura?

Eu busquei as sementes pra reconstruir
a beleza de outrora em nova geração.
Mas as flores jogaram seus úteros fora.
São só belas...
E mais nada....
Sensuais...
E mais nada...

Eu busquei os botões para lhes resguardar.
Mas as flores haviam abortado,
em nome do prazer
haviam matado....

sábado, 24 de março de 2012

POEMA CRÔNICO I

Não me mostrem a beleza que não posso ter.
A beleza que não tenho me faz sofrer,
por que não posso alcançar
o que ela me oferece.

A cada um sua parcela de beleza:
assim deveria ser.
E as belezas inacessíveis,
veladas, deveriam estar.

Mas, o que seria do poeta,
se a beleza que não acessa,
não "perturbasse" os seus sentidos
e inebriasse o seu viver?

Todo poeta é sofredor
de ânsia que delira em letras,
de versos que são "opióides",
de rimas que lhe dão prazer.

Todo poeta é louco,
louco que sonha acordado,
que sabe fugir em si;
e em si encontrar a paz

Dizem que sou louco;
e vós o julgais mui bem.
Enquantos os normais só correm
eu paro pra ver os montes
e faço a minha prece.

sexta-feira, 23 de março de 2012

UM POEMA PARA MINHA EVA

Bararam-se tuas formas no caos indefinido.
Eu dormia. Dormia sono profundo.
Eu padecia de frio, de frio absurdo.
Sentia saudades, sem saber bem de quem.

O Caos do Universo e o Caos de orfeu se uniram.
O Mundo Onírico e o princípio do mundo em minha mente tão turva.
Uma palavra soou na escuridão do nada: Ezer... Ezer...
Meu coração ansioso, sem saber bem porque
como que por instinto suspirou perguntando: onde estás? Onde estás?

Veio a resposta em forma de luz.
A luz, artífice, trouxe tons e matizes,
formas e ângulos, larguras e cores,
gestos, ações, efeitos, mensagens...

Meus olhos virgens te viram
como a criança à mãe,
vinda do âmago escuro
do caos fecundo e prenho.

Num suspirado arroubo,
uma consolação plena
me enlevou rumo a ti,
como se a alma tivesse
reencontrado o éden.

Não perguntaste meu nome,
no coração o trazias
de forma clara, indelével,
atemporal inscrição.

E dos teus lábios soou,
como canção que arrebata,
este meu nome secreto,
inscrito em teu coração.

Também o teu, já sabia,
em verso, em prosa, em canção,
de noites, sonhos, esperas,
névoas,escutas e buscas.

Guarda contigo meu nome
como segredo sagrado.
Guardo comigo o teu:
não ouso pronuciá-lo

até que se consuma
a união que esperam
nossos corpos de estrelas,
nossas almas sagradas.

segunda-feira, 19 de março de 2012

VIA

Estou tecendo uma vida
com estes retalhos de sonhos,
que vão unidos com linha
da vida que eu quero ter.

Quem me olhar dirá que sou sem nexo.
Talvez o seja!
Meu coração a vapor
acelerado caminha,
desgovernado talvez.

Por estas curvas virei
com a minha carga torta!
Perdi meus sonhos na estrada.
Muitos foram roubados.

Mas estou vivo e tenho
um coração que é só meu,
ilha no mar da existência
de rota que só eu sei.

RETIRO

Precisei sumir por um tempo.
Andava cansado.
Voltei à montanha
Tal qual velha águia.

Ah, quão precioso é o ermo fecundo,
sem vozes, sem gritos,
sem buscas, sem medos;
me enchendo de Deus,
saindo de mim!

Oh, quão belo é abandonar-se em Deus,
sem medos, sem culpas,
limites, desculpas,
pesar ou medir!

A noite escura cobriu-me com véu,
em férreo torpor de ser recriado...
dispus-me a Ele qual barro nas mãos
de exímio oleiro que molda sua obra.

E quando o sol renasceu,
vi-me transfigurado
naquele em que sou,
vivo,me movo e existo!

sábado, 17 de março de 2012

SOBRE O DESERTO QUE SOU

Neste deserto em que vago
padeço da sede dos teus beijos.
Por vezes deliro
pensando ver um oásis.

Com o deserto,
sou escassez:
de ti,
de nós,
dos teus beijos

do teu corpo,
do teu cheiro,
dos teus olhos
verde - oliva.

Temo que o deserto
me tranforme em poeira.
E tu temes vir a mim
por medo de te perderes.

O que há para ver no deserto?
Nada há no vazio estéril.
De austero, só há o calor.
De ameno, o frio da noite.

Para ti sou um homem de extremos,
um imenso de incertos caminhos;
inconstância que gera inconstância
em caminhos que perdem caminhos.

quinta-feira, 15 de março de 2012

POEMA PARA A FLOR ORGULHOSA

Tornei-me odioso á flor que eu amo.
Feliz é o pequeno príncipe:
com toda empáfia sua Rosa é humilde,
com todo orgulho perdoa-lhe mais.

Da imagem que tinha não sei o que resta.
Ficou o ruim,
o bom, esquecido,
ficou ofuscado,
talvez invisível!

Que remédio servirá
para matar um amor que não morre?
Este espinho de amor ainda vive
a pulsar, a ferir, a doer.

Outras flores,sinais já me deram:
de perfumes, de cores, de viço;
mas pareço envolto em feitiço:
volta e meia suspiro por ela.

Eu suplico clemência, oh flor,
vem, arranca do peito este espinho!
Se detestas a minha presença,
muito mais eu detesto esta vida
de incertezas,insônias e sonhos!

sexta-feira, 9 de março de 2012

NOITE TREMENDA

O velho fantasma voltou à minha porta.
Trouxe consigo a noite escura:
sem luzes,sem tempo e espaços;
sem marcos, faróis e sinais.

Mantive a porta de casa fechada.
Mantive a lâmpada acesa.
Mantive a vigília, a guarda.
Lutei com o sono da alma pesada.

Lá fora o vento sem alma,
tocava a canção que embalava os murmúrios
dos seres obscuros que na noite vagavam
sem ciência da vida ou da morte.

Fui forte.
Vesti a armadura:
A couraça da justiça,
as sandálias da prontidão,
o escudo da fé
e a espada da palavra.

Fui ousado.
Acendi a chama do meu coração.
Empunhei minha espada.
Enfrentei os fantasmas
e com preces da alma:
rasguei o véu da escuridão!

quarta-feira, 7 de março de 2012

POEMETO PARA ALGUÉM

Tua beleza divina,
Me alegra e me faz sofrer.
Enche – me a alma de gozo
E o coração de penar.

Tua beleza, menina, é como o mar:
É vastidão que não fadiga os olhos,
Imensidão que instiga o desbravar
E perigo que atormenta a alma.

Nunca singrei um mar.
Sou homem da terra.
Tampouco voei alturas;
Não tenho as asas que quero.

Mas sou um poeta que sonha,
Sou da beleza um servo,
Amo as flores dos campos
E as deusas que acenam risonhas.

Sou um poeta que sofre:
Sonhos, quimeras e odes,
Nada mais são que arroubos,
De infeliz “arquiteto”!

O CANTO DO JARDIM DESPERTADO

Meu coração é um ninho secreto,
refúgio de amor,
de sinuosa trilha
imperceptível!

É ermida de alturas,
de flores e aves,
de águas e brisas,
silêncio e música.

Ele andava esquecido,
a ninguém dava abrigo,
de tal sorte que andava
do caminho esquecido
desde a ida de Tersa
para o desconhecido!

No entanto, oh mistério,
nunca ficou vazio,
renasceu neste inverno,
o meu jardim interno,
com beleza maior
do que outrora tivera

É que a fonte selada
foi aberta outra vez;
e a Água da vida
despertou as sementes
que dormiam esquecidas.

sexta-feira, 2 de março de 2012

CANTO DE SEPARAÇÃO

Deixem que escape pelos dedos esta angústia.
Estas densas nuvens choverão saudade.
Preciso repousar da intensa luta.
Servem-me os versos de sublimação.

Sinto saudades de ti.
Saudade é abismo sem ponte
que aconselha ao contemplador:
"segue adiante", "segue adiante"!

Saudade é beleza dorida,
terra deixada,
retrato da vida
impresso na alma.

Alegres são os que contam histórias.
Felizes os que contam suas glórias.
Grandes os que conquistam vitórias.
Bem - aventurados os que vivem
Memórias de um amor verdadeiro!

Saudade é mistério profundo.
Resposta alguma a sonda,
revolta nenhuma a demove,
resignações não a solvem;
mas quem a contempla encontra:
Razão das razões escondida!

Eu tenho saudades de ti,
daquela que foste primeiro,
com olhos de sol que se põe,
com mãos de afago e de sonhos,
e colo cheiroso de Maio.

Amei-te também na tormenta,
amei-te também violenta,
com lágrimas quentes de súplicas,
inverno de bela brancura!

Mas eras deusa e eu mortal.
Sentiste saudades do olimpo,
das glórias dos cimos,
da imortalidade.

E desta sorte me precipitaste,
com minha ira mortal,
meu ouro barato,
e minha vida a esmo.